Fim de quem (pensa que) ama

O céu já escurecia quando Lucas chegou em casa. Não acendeu as luzes. Queria que a noite caísse depressa, pondo fim aquele dia turbulento e cheio de novidades desagradáveis. Fechou as persianas cor de areia, escondendo um mar de prédios onde as janelas acendiam-se uma a uma, como uma sutil provocação à sua procura pela escuridão. Deitou-se sobre o sofá vermelho de onde via um apartamento sem cores, sem cheiro, sem vida. Em meio às lágrimas, o jovem estudante de economia, relembrava os momentos que haviam compartilhado nos últimos dois anos e tentava entender como tudo escorrera pelas tubulações da decepcão em poucas horas de conversa. Nunca imaginou que ela sairia daquele jeito, dizendo, sem lágrimas nos olhos, que era para sempre. Lucas ouviu a cidade se aquietar mergulhado em suas mentiras, em seu egoísmo, na pseudo-felicidade que ela atirou em sua face branca e assustada pela manhã - um rio escuro cujas margens ele desenhou em branco e preto tendo uma caixa com vinte e quatro novos lápis coloridos. Chorou como nunca havia chorado antes. Um choro contido, corrosivo, dilacerante. Estagnado, parecia aos poucos entender como deixou de viver sua vida e impediu-a de viver a dela, sufocando, com as mesmas mãos lisas e inexperientes, as duas ao mesmo tempo. Tentou lembrar-se de quando a vira sorrir pela última vez. Não conseguiu. Confessou para a infinita sala escura que fingia não saber onde aquele ciúme doentio ia dar, por ciúme. Quase quebrou a mão quando, num súbito ataque de lucidez, socou-a contra o chão seguidas vezes, por medo. Passou a noite em claro, lamentando cada erro infantil cometido pelo desesperador medo de se perder quem se ama, por amor. Seguiu assim, amando doentemente sem saber o que, sem saber porque, sem saber pra que. E antes mesmo que que ela tivesse um tempo justo para ponderar, Lucas atirou-se, nú, do sexto andar, alçando o vôo mais melancólico e pedante que este jovem insistente escritor já narrou: - Foi patético!