1 de mai. de 2009

A batalha diária do jovem Camilo

Camilo não era como os outros garotos da sua idade. Longe disso. Monossilábico, parco e pachorrento. Camilo era difícil de entender: abissofóbico, aerofóbico, agorafóbico e outros "fóbicos". Sim, afóbico! Foi taxado de esquizofrênico, autista, nazista e até mesmo de raeliano. Vagava pelos cantos de sua rotina massacrante, era sufocado pela própria existência e sentia-se humilhado por seu próprio organismo, pelo rebuliço dos gases acomodados em seu intestino que, volta e meia, liberava-os sonora e olfativamente para o desprazer geral. Camilo era uma bomba, um desastre! Acostumado com as dezenas de dedos apontados em sua direção, sonhava todas as noites com a sinfonia de risadas estridentes que invadiam seus tímpanos todos os dias e acordava desolado.

Camilo sofria.
Camilo sofria muito.
Camilo sofria de prisão de ventre.

Passou por dezenas de médicos, especialistas, padres e até uma mãe-de santo. Foi expulso de sete colégios, do grupo escoteiro e da academia de karatê - o professor alegou "insistência em conduta anti-desportiva". Perdeu a conta de quantas vezes foi posto porta à fora a pontapés. Ônibus, trens, metrôs, lojas, igrejas, restaurantes e todo e qualquer ambiente que você possa imaginar, onde a emissão sonora de um gás altamente fedorento não convém. Experimentou 123 tipos diferentes de dieta, tomou milhares de pílulas e chás, mas os anos passavam e o pesadelo de Camilo não chegava ao fim. Muito pelo contrário. O intervalo entre as emissões tornava-se cada vez mais estreito. Aos quatorze anos tinha apenas 11 minutos de descanso entre um tiro e outro. Mas aos dezesseis, uma boa notícia: passou a ter controle sobre a sonorização de suas emissões. Com menos de três semanas de treinamento já realizava o tão sonhado "pa-pa-ra-ra-ra, pa pa". Porém, a diversão não diminuía o sofrimento do pequeno dinamite que ainda era alvo de preconceito e ganhava novos apelidos a cada dia: rojão, sapo-bolha, boca-de-berrante, bomba-relógio, fede-bosta, etc...

Camilo sofria.
Camilo sofria muito.
Mas Camilo descobriu um guru.

Prestes a completar dezoito anos, Camilo descobriu "Tshin-Gano", guru tailandês que vivia no Brasil há mais de trinta anos. Após a primeira consulta espiritual, Tshin-Gano foi direto: - Só eu posso te salvar. Camilo acreditou. Tshin-Gano prometeu repassar ao jovem pupilo uma técnica milenar secreta de respiração diafragmática, através da qual Camilo eliminaria todos os gases assim que acordasse e passaria o resto do dia livre do seu monstro intestinal. O show pirotécnico levaria, exatamente, setenta e quatro minutos. A idéia parecia ótima e realmente era. Camilo efetuou o pagamento e Tshin-Gano sumiu do mapa, levando suas economias.

Camilo sofria.
Camilo sofria muito.
Mas ainda havia esperança.

A noite já caía, quando Camilo voltava para casa depois de mais um dia de emissões inconvenientes quando apanhou um jornal que algum: - Imbecil, mal-educado! havia deixado sobre um banco da Praça Hélio Souto. Surprrendeu-se com a notícia de um grupo de adeptos da "dieta da água e da luz", cerca de quarenta pessoas que viviam no interior de uma mata e não ingeriam nada além de água mineral. Banhos de luz energizantes também faziam parte do processo. Era a última possibilidade: - No food, no show. Motherfuck! Camilo procurou a turma da fotossíntese e teve uma agradável surpresa. Após quatorze meses de água e luz, seu organismo reagiu: - Quero aproveitar essa reunião, para anunciar a vocês, meus amigos que meus gases (Ploft!) já não tem cheiro. Podem ficar, não saiam, sintam! De fato era um avanço colossal. Todos aplaudiram, assoviaram e abraçaram o petiz.

Camilo sofria.
Camilo sofria muito.
Mas o fim aprozimava-se

Após as comemorações matinais, o grupo dirigia-se à cachoeira para um banho de luz coletivo quando recebeu a visita de novos adeptos - eles haviam acabado de se matricular - vindos de uma fazenda vizinha. Pai, mãe e uma filha. Ilundi tinha dezessete anos, era alta, loira, linda e surda: - Oh, my God. She's perfect! Camilo arquitetou um plano "prisonbreakeano", sequestro a jovem e partiu rumo à felicidade. Vive em uma casa de madeira, à beira de um rio qualquer, em um estado qualquer, de um país qualquer, onde constituiu família e cagou pro seu passado.

Camilo sofria.
Camilo sofria muito.
Mas Camilo venceu seu organismo.
Você também pode vencer!

2 comentários:

Jéssica Bittencourt disse...

hahaahaha,
muito engraçado e de muito bom gosto!

Anônimo disse...

Tomara que eu tenha a mesma sorte do Camilo. hehehehehe
Se cuida, neguinho!
=****